Citros: greening avança e exige manejo rigoroso
Pior doença da citricultura mundial já levou à erradicação 14,8 milhões de plantas no estado de São Paulo
Em 2004, o produtor Clayton William Piccin verificou, em um dos pés de laranja de sua fazenda de 70 hectares, em Limeira (SP), a presença de folhas amarelas que contrastavam com a cor verde habitual das demais. Preocupado, percebeu a queda intensa e precoce dos frutos da árvore e descobriu que o greening havia chegado ao seu pomar. Piccin cortou então o primeiro pé de laranja, vítima da doença.
“Na época ninguém nos informava claramente sobre o que era a doença. Os produtores sabiam apenas que era transmitida de um pé para outro. Após dois meses do corte, eu soube da necessidade de aplicar inseticida para matar o psilídeo, inseto vetor da doença. A falta de informação na época levou a doença praticamente a tomar conta do pomar. Foi um cenário ruim e muito diferente do que ocorre hoje, em que somos avisados sempre que há algo novo sobre os hábitos do psilídeo", diz Piccin.
Desde 2005, 14,8 milhões de plantas foram arrancadas dos pomares paulistas, segundo dados dos relatórios entregues pelos citricultores à Coordenadoria de Defesa Agropecuária do Estado de São Paulo. O número de talhões contaminados pelo greening cresceu de 3,4%, em 2004, para 53,4%, em 2011, e a quantidade de plantas doentes saltou de 0,58%, em 2008, para 3,78%, em 2011.
O greening é atualmente a pior doença da citricultura mundial. Sua erradicação é quase impossível, principalmente por afetar uma cultura de grande extensão como a de citros, segundo o presidente do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), Lourival Carmo Monaco. “O correto é falar em controle. O cancro cítrico, por exemplo, foi mantido sob controle até recentemente, e a eficácia só caiu quando a ação integrada de todos os envolvidos na política fitossanitária foi extinta. No caso do greening, o manejo é fundamental para manter a incidência em baixo nível enquanto se busca material resistente à bactéria ou se desenvolvam variedades com genes que induzem repelência ao psilídio. As técnicas modernas de melhoramento para resistência, apesar de acelerar o processo, ainda exigem longo período de adaptação e avaliação regional”, diz Monaco.
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O manejo do greening foi desenvolvido com base nos trabalhos do Fundecitrus. Depois de caracterizada a expressão da doença nos pomares paulistas, foi preciso conhecer a eficácia da identificação visual dos sintomas. “Nesse início, além do treinamento de pessoal, o Fundecitrus disponibilizou testes para a confirmação da doença em seu laboratório, possibilitando definir as normas para manejo da doença”, complementa Monaco.
O produtor Clayton Piccin inspeciona sozinho, sistematicamente, cada um dos 22 mil pés de laranja em sua propriedade, sempre verificando poucas árvores por dia. “Já perdi 10% do pomar desde que a doença surgiu. Estou sempre replantando após o corte e algumas árvores replantadas já tem o greening. Marquei o lugar da primeira que eu cortei, em 2004, e desde então percebi que a nova muda rende menos que a anterior, então, ao cortar uma, planto duas”, relata. Cerca de 70% das árvores de Piccin foram plantadas em 1998.
Plantas jovens
Para o citricultor ser mais eficiência é preciso...
• Saber identificar os sintomas da doença; |
O psilídeo é um pulgãozinho do tamanho de um grão de arroz que suga a planta, atraído pela cor amarela das folhas. Em pouco tempo, ele transmite a doença para outra árvore. “Temos que considerar o manejo da doença como um todo. Ao detectar plantas doentes, o citricultor já sabe da possibilidade de existirem outras árvores contaminadas no pomar, embora estejam assintomáticas. Todo o manejo, incorporando o controle do inseto vetor, inspeção e eliminação das plantas sintomáticas, requer um tempo considerável para surtir os efeitos desejados”, esclarece o presidente do Fundecitrus.
Por esse motivo, e diante da necessidade de cuidados das plantas novas, não se recomenda o replantio até que as curvas de detecção da doença apresentem-se constantes ou em decréscimo. Além do manejo na propriedade é preciso considerar o ambiente onde a laranja é cultivada e a qualidade do manejo do greening em propriedades vizinhas para que, a partir de então, sejam substituídas as plantas erradicadas. “É preciso lembrar ainda que a doença causa mais danos em plantas jovens”, acrescenta Monaco.
A colheita na propriedade do citricultor Clayton Piccin, em Limeira, se encerrou no dia 30 de janeiro. “Essa foi a safra em que cortei menor quantidade de pés de laranja e uma das mais produtivas. Foram 75 mil caixas de 40,8 quilos, contra 48.902 na passada. A estimativa para a próxima é de 50 mil caixas e, no futuro, será difícil passar disso. Hoje eu não recomendaria essa atividade de citricultor e, se tivesse que começar de novo, não seria com essa cultura. Em 2004, quando a doença começou no pomar, eu era mais novo, tinha vontade de ter mais terras para plantar. Mas hoje, os preços pagos pela indústria e esse manejo necessário para controle do greening tornam meu negócio quase inviável”, diz o produtor.
Para o presidente do Fundecitrus, a queda de rentabilidade, condicionada à boa produtividade, leva o produtor a buscar outras alternativas agrícolas. A queda de produtividade nos pomares mais velhos e a flutuação de preços pagos ao produtor exigem cada vez mais tecnologia e redução nos custos de produção. “O greening veio para acelerar a decisão daqueles que se encontravam na margem da produtividade. E os custos ligados ao manejo tem levado produtores a entrarem no agronegócio da cana. Mas é importante ressaltar que, apesar do greening, muitos produtores estão expandindo o plantio ou mantendo a população de citros com replantio”, afirma Monaco.
Pesadelo
O Citrus Greening é uma praga devastadora que se tornou um pesadelo para citricultores em diferentes continentes, capaz de provocar perdas irreparáveis nos pomares onde se instala. Conhecido como Huanglongbing (HLB), o Greening, de origem chinesa, é transmitido por insetos que, ao sugar o líquido das folhas, deixam bactérias que podem paralisar o sistema vascular de uma árvore, cortando o fluxo de açúcar e outros carboidratos das folhas para as raízes. A doença torna as árvores extremamente fracas para sustentar o crescimento saudável dos frutos. A laranja é prejudicada e fica com um sabor ácido.
Supersafra
Com uma área total de plantio estimada em cerca de 600 mil hectares, o estado de São Paulo colheu, no ano passado, a segunda maior safra de citros da história, com 428 milhões de caixas, apesar dos efeitos do greening. A supersafra ocorreu pelo clima favorável, uso de tecnologia e novos pomares atingindo idade produtiva. Este ano, a estimativa é alcançar 364 milhões, retornando aos padrões de produção do estado.