Presidente da Famasul afirma que Brasil no topo da cadeia produtiva não é projeção, e sim realidade
29 Dec 2010
Foto: divulgação/Famasul
Eduardo Riedel não utiliza eufemismo para definir sua função de presidente da Famasul, a Federação de Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul. “O trabalho é de lobby mesmo. Aqui no Brasil é uma palavra pejorativa, mas é lobby”, afirma.
Formado em Biologia e produtor rural de Maracaju, cidade localizada a 150 quilômetros da capital Campo Grande, Riedel assumiu o comando da entidade em fevereiro de 2010, após Ademar Silva Junior, presidente eleito, assumir cargo na CNA (Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil). A partir de 2011, o biólogo presidirá também o Conselho Deliberativo Estadual do SEBRAE/MS
Com pouco tempo disponível para acompanhar as informações que recebe e já apressado para outra entrevista, Riedel responde que o meio que mais utiliza para se manter a par das notícias do agronegócio é a mídia digital. Olhando para seu computador, confessa: “quem tem a disponibilidade, acessa primeiro na internet o que sai no jornal ou na televisão. É o meio mais rápido de acessar o conhecimento”.
Para falar sobre os próximos desafios da agropecuária nacional, Eduardo Riedel recebeu nossa equipe com exclusividade e afirmou que o Brasil é a fazenda do mundo. “O país tem uma perspectiva no agronegócio que não é mais futuro, é realidade”, garante. Confira abaixo a entrevista.
Como o produtor pode lidar com espaço cada vez mais reduzido para produzir, sabendo que em pouco tempo a demanda por alimento vai aumentar?
A grande orientação é em cima de eficiência de produção. Se analisarmos o histórico da evolução do volume produzido de qualquer produto, pode ser carne, suíno, frango, bovino, leite ou grãos de uma maneira geral, a evolução da área utilizada para a produção desses alimentos todos é muito aquém da evolução da produção deles. De 1980 pra cá, você tem uma evolução da produtividade e da eficiência muito grande, que está baseada no desenvolvimento de pesquisa e tecnologia na área de genética, nutrição de animais ou plantas, manejo, desempenho das máquinas e conhecimento de gestão, que parece que não funciona, mas funciona muito. É uma série de fatores que elevaram muito a produtividade e não para.
Isso tem um perfil de desenvolvimento mais acentuado do que a possibilidade do aumento de área. Agora a eficiência exclui o ator do processo. Se ele não for eficiente e não acompanhar essa evolução com um nível de tecnologia adequado, o mercado o coloca pra fora. Os gráficos de commodities mostram o seguinte: você tem um determinado preço médio de um produto, aí aquele preço remunera o ator de produção. Com o tempo, você diminui aquele preço e os que estão produzindo acima desse custo são excluídos. Ficam os mais eficientes e a tendência do preço é abaixar.
O senhor acredita que vai chegar o dia em que a produtividade terá um limite e que a área não vai suportar?
Eu acho existirão novas possibilidades de tecnologia que talvez a gente nem tenha hoje e que vão suprir essa demanda. Se você pensar em área, nós temos muito a explorar. No Brasil, a área de pastagens para a pecuária de corte é de 170 milhões de hectares. Isso é três vezes e meia a atual área de produção de grãos a ser explorada com um nível de tecnologia muito maior do que existe hoje. Nossa lotação (em torno de uma unidade animal por hectare [1 UA/ha] na média), pode evoluir em torno de 4 ou 5 UA/ha. Hoje você precisaria de um quinto da atual área de pastagem, sem falar em abertura de área, conversão de biomas, que é a transformação do cerrado, floresta amazônica, caatinga ou mata atlântica em produção.
Sem fazer essa conversão, o que nós temos é 53% do nosso território ainda preservado, e usando só o que já foi utilizado, com o aumento de tecnologia e eficiência, nós podemos ir muito longe ainda pra oferecer alimento na demanda pelos próximos 30, 35 anos que estão por vir. Até 2050, vai dobrar a demanda por alimento. A gente pode dobrar a produção sem mexer em nada da área produtiva brasileira.
O aumento dessa área não conta com as terras que o governo quer destinar para a reforma agrária e demarcações indígenas?
Sem contar. O Brasil tem 112 milhões de hectares destinados às reservas indígenas, 13% ou 14% do território nacional. Se você quer separar aqui no Mato Grosso do Sul mais 200, 600 mil, 1 milhão de hectares, é uma opção de governo. Isso impacta muito na economia local ou regional, dependendo da dimensão que isso toma, mas não impacta no volume brasileiro da produção de alimentos.
Tendo em vista que não existe uma demanda urgente quanto a essa insegurança jurídica para aumento de área para produção, qual a principal preocupação agora para os produtores?
Eu acho que a principal demanda por parte do setor produtivo é justamente essa, a insegurança jurídica. É a mais urgente. Quando se fala de insegurança jurídica, não podemos lembrar só de índio. Tem alguns fatos curiosos que no nosso conceito são absolutamente ideológicos. Vamos falar sobre o problema fundiário. Aí você envolve índio, quilombola, sem-terra, vamos colocar tudo em um grupo.
É o grupo da reforma agrária?
Reforma agrária é o caso dos sem-terra. A questão indígena não é isso. É expropriação e doação por um conceito extramente subjetivo, que é a oralidade da pessoa, onde ela esteve. Então a questão fundiária é uma segurança jurídica muito séria.
A questão ambiental é outra insegurança jurídica extremamente séria. A aplicação de multas em cima de situações constituídas há 30 ou 40 anos tira aquele produtor do processo. Dentro da condição fundiária, você tem uma linha ideológica de governo paradoxal, que coloca a propriedade pequena sem a condição de fazê-la produzir com eficiência. A gente vinha falando que essa é a única situação que pode fazer frente a essa demanda como o carro-chefe da produção, mas quando a gente analisa os números do censo 2006, não é bem isso. Tem uma realidade completamente inversa a essa situação. Então o governo usa muito um discurso, mas na prática acaba agindo de maneira diferente.
O que as organizações podem oferecer ainda ao produtor que busca maior segurança e produtividade?
Ambiente de competitividade. O produtor brasileiro tem que ser competitivo no mercado global, porque ele produz alimento pra cá e para o mundo. Primeiro ele pode ser ameaçado no negócio dele por qualquer tipo de insegurança jurídica dessa natureza que a gente comentou. Depois ele tem que ter condição de infraestrutura e logística adequada pra diminuir o custo dele. Se você produz aqui a um custo x e gasta mais para colocar o alimento na China, Europa, Estados Unidos ou África, alguma coisa está errada. Você tira a competitividade desse produtor. A parte que cabe ao Estado brasileiro realizar é dar condição de competitividade. A política tributária fiscal, por exemplo, é extremamente agressiva no Brasil e tira a competitividade desse produtor.
O que nós, instituições e associações de classe, temos que fazer o tempo todo é gerar competitividade através de política tributária fiscal adequada, cobrar das instituições públicas o aporte de recursos e desenvolvimento de infraestrutura e logística. Nós temos deficiência de portos, ferrovias, hidrovias, estradas. Devemos cobrar também uma política de financiamento adequada. São vários vetores de políticas públicas direcionadas não só ao setor, mas para competitividade da iniciativa privada, que podem gerar esse ambiente. O resto é dever de casa e o produtor, com conhecimento, tecnologia e gestão, dá conta do recado. Aquele que não der conta, também estará excluído do processo.
O senhor acredita que todo produtor deve estar inserido em algum tipo de rede?
Com certeza. Seja ela de proteção política, de cunho comercial ou associativismo cooperativo para comprar ou vender insumos. Não importa o tamanho. A gente faz muito a ideia que cooperativa é coisa de pequeno produtor. Negativo. Tem pequeno, médio e grande que devem se associar para buscar maior eficiência na sua negociação, seja na compra ou na venda. Ele pode buscar nas redes e na integração com as entidades a defesa política e setorial.
Fonte: José Luiz Alves Neto / Rede Rural Centro